Entrevista | Guga Carvalho fala sobre a Enciclopédia Virtual de Artes Visuais do Piauí
Guga Carvalho é coordenador de artes visuais da Fundação Cultural Monsenhor Chaves (FCMC), vinculada à Prefeitura de Teresina
Boa notícia pra galera do Piauí! A Fundação Cultural Monsenhor Chaves (FCMC), órgão vinculado à Prefeitura de Teresina-PI, está prestes a lançar uma plataforma digital que tem tudo pra fortalecer - e muito - a cena artística no estado. Ainda neste semestre, o público terá acesso à Enciclopédia Virtual de Artes Visuais do Piauí, que reunirá os principais nomes da produção artística local e também dos talentos piauienses que tiveram projeção nacional, como Elisa Martins da Silveira e David Cury.
O objetivo é transformar a plataforma em uma vitrine que ultrapasse fronteiras, mas que também seja uma ferramenta que aproximará a população da arte produzida no Piauí. Além do potencial para se tornar um material de consulta fundamental, a enciclopédia também pode ser um passo importante no historiografia da arte piauiense.
'A Banda' (1967), óleo sobre tela da piauiense Elisa Martins da Silveira
Pra saber mais sobre o assunto, o Pigmum conversou com Guga Carvalho, que é coordenador de artes visuais da FCMC e está à frente do projeto! Além de dar mais detalhes, ele falou sobre outras iniciativas que estão servindo de modelo à enciclopédia, avaliou as últimas edições do Prêmio de Criação em Artes Visuais e adiantou algumas novidades que ainda estão por vir em 2018. Confira:
Pigmum: Como surgiu a ideia de criar a Enciclopédia Virtual de Artes Visuais do Piauí e por que a opção pelo formato digital? Há previsão ou intenção de se publicar também uma versão impressa?
Guga Carvalho: Pelo simples fato de que é necessário acessar os artistas visuais de Teresina. De vez em quando, alguns pesquisadores e curadores Brasil à fora me perguntam sobre artistas daqui e reclamam da falta de material de consulta. Com a enciclopédia haverá, pelo menos, um mapa geral e a partir daí vai ser possível estabelecer um contato posterior. Outro motivo é que os próprios artistas visuais de Teresina não conhecem seus pares. Por exemplo, Elisa Martins da Silveira é pintora naïf teresinense, aluna de Ivan Serpa, teve inserção no circuito Rio-São Paulo, foi premiada na segunda e na terceira edição da Bienal de São Paulo e é uma mera desconhecida aqui. Tem Babidu Barboza, integrante do Grupo Empreza, de Goiânia-GO, que pouco é absorvido aqui na cidade. O David Cury e Jozias Benedicto, que moram no Rio e também são distantes da cena de Teresina. O Willyams Martins, radicado em Salvador, idem. Por incrível que pareça, por meio da enciclopédia, muitos artistas visuais da cidade terão contato com esses nomes e com outros pela primeira vez. E olha que estamos falando de Teresina, que não tem uma cena de artes com milhares de criadores.
'Circo' (1957), óleo sobre tela de Elisa Martins da Silveira
'Bar Ben', óleo sobre tela de Elisa Martins da Silveira
Pigmum: Um problema recorrente no Brasil em iniciativas como essa é a continuidade do projeto, seja por falta de investimentos ou de profissionais especializados para fazer a manutenção e atualização das informações. Como se trata de uma plataforma digital que se pretende viva e atuante, é de se esperar a inclusão de novos artistas e de atualização de material ao longo do tempo. Como a Fundação está se preparando para garantir, a médio e longo prazo, a continuidade e consolidação da Enciclopédia Virtual de Artes Visuais do Piauí?
Guga Carvalho: Apesar de ser bem simples, estou tendo muito trabalho em preparar muitos pequenos textos e selecionar muitas obras, além de conferir se esse material segue os padrões técnicos mínimos para inclusão no site, que só irá ao ar daqui a uns dois meses, mais ou menos. A ampliação de novos artistas será constante. Estou treinando também outra pessoa para fazer a parte técnica. Mas a equipe é muito pequena, o que não impede de ser feito. Se a gente esperar pelas condições ideais... A melhor maneira de se esperar é fazendo, dando o disparo inicial.
'Antonio Conselheiro 2', obra assinada por David Cury. Fotografia: Wilton Montenegro
Pigmum: Que outras enciclopédias virtuais na área estão servindo de exemplo ao modelo piauiense?
Guga Carvalho: Olha, há sites de pesquisa em artes que gosto muito. O UbuWeb é o que me vem agora na cabeça. Gosto da praticidade dos sites de galerias de arte, como o da galeria Luisa Strina. Se você reparar, é um padrão que se repete em muitos outros. Tudo muito simples, predominância do branco para não sufocar as obras, links para artistas, exposições, etc. A enciclopédia do Itaú Cultural já gostei mais no passado, hoje em dia acho confusa e com muitos links que se abrem para texto nenhum, dá uma impressão de cadastro chato.
Página inicial da plataforma UbuWeb, voltada às manifestações artísticas experimentais
Página inicial do site da Galeria Luisa Strina, que está servindo de modelo para a Enciclopédia de Artes Visuais do Piauí. A ideia é deixar o site clean para que as imagens falem por si
Pigmum: Quando a plataforma digital será lançada e até quando o/as artistas interessado/as podem enviar seus materiais?
Guga Carvalho: A enciclopédia vai ao ar quando estiver com no mínimo uns sessenta artistas, com texto final redondo. Isso demora muito, pois na prática o artista manda um borrão, daí reelaboro, envio de volta e ficamos nesse ping pong. Agora, multiplique isso por cem! Esse é o meu trabalho. Quando tivermos ok com uns sessenta artistas, lançaremos. Daí, os outros serão postados paulatinamente.
Pigmum: Na sua opinião de artista e também de gestor, em que áreas ou linguagens das artes visuais você considera que a produção artística piauiense mais se destaca?
Guga Carvalho: A fotografia tem crescido substancialmente. Me refiro à produção dos artistas visuais que fazem uso da fotografia ou de fotógrafos que se expandem em outras linguagens. Há um panorama conceitualmente mais instigante que em outras frentes. Danilo Medeiros, Maurício Pokémon e André Gonçalves têm caminhos distintos e poéticas atuais. Tem também o Paulo Gutemberg, que é fotografo e pesquisador. Em 2015 ele ganhou o primeiro lugar no Prêmio Marc Ferrez com uma pesquisa sobre um dos velhos mestres da fotografia daqui, Guilherme Müller. Outra pesquisa feita também por um fotógrafo foi do Antonio Quaresma, que discutiu identidade em seu mestrado em Nova York, trazendo à discussão o trabalho de seu Chiquinho, um fotógrafo lambe-lambe que fazia fotos 3x4 em frente ao Museu do Piauí, aqui em Teresina. Enfim, esses certamente estarão na enciclopédia.
Projeto 'Existência', assinado por Maurício Pokémon, que espalhou pelas ruas de Teresina fotografias de moradores da Av. Boa Esperança
Os moradores daquela localidade resistiam à desapropriação planejada pela prefeitura de Teresina. A ideia das fotos era mostrar à cidade que ali havia pessoas e sonhos
Pigmum: Em 2017, foi lançado novamente o Prêmio de Criação em Artes Visuais. Podemos esperar uma nova edição em 2018? Após 2 anos seguidos de realização, como você avalia a repercussão do prêmio entre artistas e o público de Teresina?
Guga Carvalho: A residência tem sido muito instigante e muitos artistas do Brasil já estão de olho na abertura do edital desse ano. Se tudo ocorrer como planejo, deve sair agora em abril. No espaço local, a residência opera como a chave para acessar outra maneira de ser artista visual, de ser pesquisador... Não no sentido especificamente acadêmico, mas no sentido de desenvolver/pesquisar questões, investigar imaginários, trocar experiências com outros residentes, etc.
Livro publicado pelo fotógrafo Paulo Gutemberg, que venceu o Prêmio Marc Ferrez de Fotografia 2015. O livro apresenta fotos antigas de Teresina, sob o olhar do também fotógrafo Guilherme Müller
Pigmum: O último edital do prêmio – publicado em julho de 2017 – contemplou 5 artistas com uma quantia de R$ 7 mil para cada um, prevendo a realização de residências de criação. Fale um pouco mais sobre esse modelo de criação artística e como você avalia a execução dos projetos contemplados ao longo de 2017. O que mudou no circuito artístico de Teresina?
Guga Carvalho: A residência de criação tem duração de três meses. Os artistas se encontram no laboratório de criação, mais ou menos três vezes por semana. Lá eles vivenciam mais a discussão-criação sobre o trabalho que está sendo desenvolvido do que a criação-execução. Tudo é cambiável, negociável, menos o imperativo categórico canônico talmúdico de que o criador tem que se encontrar com os outros, nos laboratórios de discussão. Faz parte da proposta. Apesar de ser uma bolsa de criação individual, essa criação tem que ser atravessada em algum momento.
O Theatro 4 de Setembro, em Teresina, em foto assinada por Guilherme Müller
Pigmum: Embora o ano esteja só começando, como anda o planejamento de ações da Fundação Monsenhor Chaves para 2018? Além da Enciclopédia de Artes Visuais, que outros projetos o/as artistas e o público podem esperar?
Guga Carvalho: Abrimos agora, no finalzinho do ano passado, um novo espaço expositivo dentro do Mercado Velho de Teresina, uma construção de um século e meio. As exposições acontecem no mezanino, que foi adaptado para galeria de exposições. Isso é ótimo porque tem uma comunicação entre a exposição e o fuzuê do mercado, bem nordestino, acontecendo no seu dia a dia, com rapadura, cajuína, chapéu de palha, ervas da medicina popular, etc. Outro projeto que estou empenhado agora é na roteirização de um filme sobre a obra visual do Torquato, neto para o canal Curta!, que é um desdobramento de umas exposições que venho fazendo sobre a visualidade e o processo criativo de Torquato. Estou também com um projeto de catalogação e organização do acervo da artista Fátima Campos, que é parceira nesse processo. Depois vamos subir esse material para um site dela. Fátima é uma pesquisadora fantástica do barro, parte da tradição piauiense e se desdobra em outras coisas, algumas estranhas. Enfim, é uma referência da arte aqui. Por coincidência, assim como a Elisa Martins da Silveira, Fátima também foi aluna de Ivan Serpa. Vai ser bacana disponibilizar esse acervo virtualmente.
Pigmum: Guga, muito obrigado por responder essas questões e eu espero que 2018 seja um ano de muitos avanços para a cultura e as artes visuais em Teresina!
Guga Carvalho: Obrigado a você, Renato!

ATENÇÃO:
Se você é artista visual piauiense ou atua no estado e deseja participar da Enciclopédia Virtual de Artes Visuais do Piauí, saiba que novos nomes serão incluídos continuamente na plataforma! Portanto, envie seu material para o e-mail gugacarvalho72@gmail.com, contendo texto biográfico com até 200 palavras, 10 fotos ilustrativas de suas obras (no mínimo 1024x768px e 72 dpi de resolução e, no máximo, 1920x1080px e 300 dpi de resolução). Cada imagem deve conter título, técnica utilizada, dimensões da obra e local onde se encontra.
Simples assim! =)